Artigo publicado também no Blog do Eliomar e repercutido pelo dep. Capitão Wagner na tribuna da Assembleia Legislativa
O prefeito Roberto Cláudio (PDT) enviou à Câmara Municipal de Fortaleza (CMFor), em regime de urgência, projetos tratando do reajuste de vencimentos e salários do funcionalismo municipal. Propôs 2% de reajuste retroativos a janeiro/16 e 8,5% em dezembro, sem reposição inflacionária. Ano passado, Fortaleza teve uma inflação 11,43%, tendo por base o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
Conforme estudo do economista e professor da UFC, Aécio Oliveira, “a inflação acumulada de maio de 2008 até dezembro de 2015 foi 66,47%, enquanto que os reajustes de salários totalizaram 37,84%. Seria necessário um reajuste de salários de 20,77%, a partir de 1º de janeiro de 2016, para recuperar o poder de compra de maio de 2008”.
O que o prefeito propõem é ridículo, não recupera a perda salarial dos servidores e esses 8,5%, pagos em dezembro, serão corroídos pela inflação deste ano. Somente nos dois primeiros meses, a variação foi de 2,25% pelo IPCA.
Na justificativa dos projetos enviados à Câmara e nas negociações com sindicalistas, o discurso do prefeito é de crise, de contenção de despesas e de responsabilidade do gestor público perante o momento. Mas Roberto Cláudio, com aprovação dos vereadores, não hesitou em aumentar a verba destinada ao seu gabinete em 57% para este ano (de R$ 116 milhões em 2015 para R$ 183 milhões em 2016) e em enviar à CMFor o maior orçamento dos últimos anos 10 anos. Que crise braba hein?
Ele também não hesitou em aumentar a terceirização na Prefeitura, o que redunda em queda na qualidade dos serviços. Nos dois últimos anos empenhou com a Ecofor, concessionária responsável pela Gestão de Resíduos Sólidos Urbanos, R$ 555 milhões. Para o Instituto de Saúde e Gestão Hospitalar (ISGH), uma organização social que atua na área da Saúde, em 2014 e 2015 foram empenhados R$ 287 milhões. Como sabemos, a cidade está tomada pelo lixo e a saúde permanece caótica.
Dia 22 de março, sob veemente protesto dos servidores, os projetos de reajuste foram aprovados pelo Legislativo sem alterações e sem levar em conta o descontentamento e as necessidades do funcionalismo. Parte dos vereadores denunciou que a aprovação feriu o Regimento da Câmara.
A CMFor funciona como uma câmara de eco do Paço Municipal. Se o prefeito mandasse para a Casa um projeto propondo que o céu fosse pintado de vermelho com bolinhas na cor verde limão, ele seria aprovado em regime de urgência.
Dia 08/03/16, mesma data da chegada dos projetos, o vereador Evaldo Lima (PC do B), que é líder do prefeito, fez pronunciamento “enaltecendo” o reajuste. Como seus pares, que apresentam projetos liberando templos religiosos da necessidade de alvarás de funcionamento, ou que querem entrada gratuita nos ônibus de Fortaleza para missionários cristãos, o vereador defende uma completa falta de senso. Passa atestado de burrice ao eleitorado e eleva a novos píncaros a expressão “cretinismo parlamentar”.
Na mesma data da aprovação do reajuste para servidores (que mais parece um confisco), de forma sorrateira os vereadores aprovaram para si próprios reajuste de 10,67% retroativo a janeiro e com aplicabilidade a partir de 1º de abril. Agiram assim mesmo a lei dizendo que eles próprios não podem reajustar seus salários na legislatura em vigor.
Conforme a imprensa, a desembargadora Maria Iraneide Moura Silva suspendeu a greve dos professores no dia 25/2. Em caso de descumprimento, arbitrou multa diária de R$ 100 mil. Achando pouco, proibiu manifestações a uma distância menor que 500 metros de escolas municipais. Entre as justificativas para o ato, estava a de que a greve era abusiva pois tinha “cunho apenas financeiro”.
Também segundo a mídia, no dia 1º de março foi a vez do desembargador Raimundo Nonato Silva Santos suspender a greve dos enfermeiros e odontólogos do PSF. Em caso de descumprimento arbitrou multa diária (R$ 10 mil para cada sindicato) e mandou que os grevistas "se abstenham de realizar qualquer tipo de ato ou manifestação a menos de 500 metros da sede da Secretaria Municipal de Saúde e do Município, e não haja impedimento à Administração de acesso aos postos de saúde, instalações e outros equipamentos necessários para a prestação do atendimento à saúde da população".
Há anos que o prefeito de Fortaleza desobedece a legislação e desconsidera direitos elementares dos servidores tais como o cumprimento de jornadas de trabalho, pagamento de anuênios e outros. Também desrespeita diretrizes do Conselho Municipal de Saúde e termos de ajustamento de conduta, assinados perante o Ministério Público, com graves prejuízos à população. Não bastasse tudo isso, quer gastar em outras áreas cerca de R$ 290 milhões oriundos de verba do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e da Valorização do Magistério (Fundeb) e que deve ser usada exclusivamente para a educação, conforme opinião do MP/CE e do MPF/CE.
Além disso, são consagrados na Constituição Federal o direito de greve, de livre manifestação e de organização sindical.
Como já dizia um veterano repórter, perguntar não ofende: os magistrados do TJCE desconhecem tudo isso? Direitos assegurados constitucionalmente não são mais aplicáveis? Quando se trata do Executivo é válida a máxima “sed lex dura latex”?*
Termino citando duas frases e fazendo uma pergunta. Martin Luther King disse que “a injustiça num lugar qualquer é uma ameaça à justiça em todo o lugar.” E em um cartaz durante as manifestações de 2013, vi escrito: a justiça é cega, mas a injustiça nós podemos ver. Até quando vamos ver, calar e aceitar?
Em tempo: assessoro o Sindicato dos Servidores e Empregados Públicos do Município de Fortaleza (Sindifort). No entanto, as opiniões expressas no artigo são de minha inteira responsabilidade.
*Paródia do dístico “sed lex dura lex” que pode ser traduzida como “ a lei é dura, mas estica”
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