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12 maio, 2020

O coronavírus e a economia: quais caminhos? (Parte II)





Mais uma vez e com muito prazer abrindo espaço aqui no blog para um texto do professor do Curso de Economia Ecológica da Universidade Federal do Ceará (UFC), Aécio Oliveira.
Ele reflete com fôlego, lucidez e sólida argumentação sobre o delicado momento pelo qual passa a humanidade e traz  valiosa contribuição do ponto de vista da economia e dos novos paradigmas na área.



Introdução


Assiste-se no mundo a fragilidades estruturais que resultaram da aplicação dos princípios do pensamento neoliberal, sob a forma de dramáticas desigualdades sociais. Por dentro do capitalismo não há saída; há inúmeros prenúncios de que a moderna sociedade produtora de mercadorias está em uma encruzilhada buscando saídas para continuar sua mortífera trajetória. Mas, a encruzilhada apenas mostra que o sistema se encontra, de fato, no início de seu fim; ou da extinção da espécie humana. De crises em crises fica cada vez mais cristalino que o capitalismo não oferece condições para uma existência harmoniosa do homem com a Natureza. Ou sua superação (no sentido dialético) ou a gratidão “eterna” do Planeta pelo favor que fará em livrá-lo da humanidade.

A economia do capital é desde sempre “a contradição em processo”; a pandemia reforça e visibiliza suas consequências na econômica e na sociedade. Com as privatizações e a liberalização dos mercados financeiros, iniciadas nos anos de 1980 – M. Thatcher (1979) e R. Reagan (1981) –, juntamente às restruturações produtivas e às inovações tecnológicas que se seguiram com o advento das TIC (Tecnologias da Informação e da Comunicação) – e agora com o suporte dos DB (Data Bank) e da AI (Artificial Intelligence) –, acentuaram-se as crises econômicas, a cresceram as desigualdades sociais e sobretudo, generalizaram-se as agressões impetradas contra os ecossistemas. Em particular, o sistema imunológico das pessoas tem-se debilitado, certamente como resultado da mudança do uso da terra, da ingestão de alimentos ultraprocessados (com aditivos químicos) e pelas pressões psicológicas originadas da luta pela sobrevivência. Ademais, em nome da governança financeira e da impagável dívida pública, 40 anos de neoliberalismo têm causado um enorme estrago nos sistemas públicos de saúde, de educação e de proteção social. O chamado mundo moderno, portanto, enfraqueceu mais ainda as defesas imunológicas da espécie humana.

Ao longo de 40 anos de neoliberalismo, os serviços de saúde e a proteção social têm sido sistematicamente desmontados em todo o mundo. Em particular, o sistema de saúde pública, e mesmo privada, não consegue dar conta do aumento abrupto de demanda por leitos, UTI, equipamentos e serviços laboratoriais. No Brasil, se a contaminação afetar 1% da população (cerca de dois milhões de pessoas) todo o sistema de saúde entrará em colapso completo. A dinâmica diferenciada da contaminação em capitais importantes está a exigir medidas integradas e urgentes para o enfrentamento da ferocidade assustadora do coronavírus. Cresce a necessidade de mobilizar um crescente volume de recursos como parte da tentativa de evitar mais perdas de vidas. O coronavírus não é democrático. Em sua trajetória tende a causar mais estragos junto aos segmentos mais vulneráveis da pirâmide das desigualdades. A atenção para esse segmento terá que ser mais acurada.

Quando se trata de salvar vidas, impõe-se um debate sobre o que é essencial e o que pode ser desativado temporariamente na economia. Evidentemente, se a economia já estiver em processo de estagnação, com é o caso da economia brasileira, a desativação temporária de empresas amplifica o impacto negativo da pandemia sobre o PIB. A economia, no entanto, continuaria funcionando tendo por base as cadeias produtivas dos setores que continuarem produzindo bens e serviços essenciais. Como seria garantido o funcionamento dos segmentos e setores essenciais da economia? Em circunstâncias de pandemia, como construir um conceito ou uma definição do que seja essencial? É claro que, para alcançar consensos, essa construção terá que realizada com a sociedade civil para que seja transformada em uma política de Estado.

Em virtude da urgência, qual seria a decisão mais sensata? Uma opção é o governo deixar o mercado funcionar livremente e estimular o crescimento econômico, sabendo do risco de ceifar uma enorme quantidade de vidas. Essa é a opção do presidente do Brasil. (Outros governantes se arrependeram de ter escolhido esse caminho.) A outra opção é buscar todos os meios possíveis para garantir a compra dos acessórios de proteção individual para os profissionais de saúde, dos insumos e equipamentos para as unidades hospitalares, e garantir internamentos adequados para aqueles e aquelas que forem contaminados pelo COVID-19. Ambas as opções têm por pressuposto a não incompatibilidade entre salvar vidas e manter a atividade econômica. É uma questão de ênfase: a proporção dos recursos a serem alocados nos serviços médico-hospitalares e a proporção que seria destinada para estimular a expansão econômica.

Alimentado pelas manifestações de rua que ocorreram recentemente – em algumas poucas capitais brasileiras, diga-se, – a ênfase do atual presidente e de seus apoiadores recai na economia com isolamento vertical que aparta socialmente os idosos. Argumentam os manifestantes que o governo federal e de outras esferas não devem se curvar diante de um vírus, seja qual for sua letalidade. Em suas mentes verde-amarelas, importa mais assegurar o fluxo de dinheiro, mesmo que isso signifique o risco de contaminação, e eventualmente de morte, dos trabalhadores e das trabalhadores que produzem a riqueza daqueles que reivindicam <<queremos trabalhar>>. Evidentemente, essa ênfase aumenta o risco de contaminação dos idosos pelos jovens, mesmo que não evite a contaminação destes últimos. Seja o que deus (Mercado) quiser.

É uma escolha que atende à vontade de pessoas influentes que desejam, a qualquer custo, continuar ou retomar plenamente suas atividades econômicas e sociais; pessoas que, sobretudo, desejam manter ativo o fluxo de dinheiro. O que acontecerá com o sistema de atendimento médico-hospitalar se essa vontade for plenamente atendida?

A solução <<seja o que o mercado quiser>> está sendo sutilmente apresentada com uma roupagem científica pelo novo ministro da saúde, como soe acontecer em circunstâncias de crises, mais ainda quando se quer evitar que a discussão alcance um público mais amplo. Repete-se, como se fosse um mantra, que é preciso ampliar as informações para mais bem conhecer o comportamento do coronavírus. Quem irá fornecer essas informações?

Enquanto a vacina, ou algum medicamento, não surge nos laboratórios dos cientistas, os gestores públicos de plantão, buscam informações para conhecer, estatisticamente, o comportamento errático do vírus, mesmo sem saber absolutamente nada de sua biologia. O que transparece é que querem substituir o conhecimento científico por uma espécie de distribuição “necrótica” de probabilidade. Com base nessa distribuição, nos lugares onde os riscos de contaminação forem maiores, após alguma confirmação, lá serão alocados recursos em termos de pessoal, equipamentos, materiais e instalações hospitalares para atender determinado número de contaminados. Com a aleatoriedade da contaminação, o problema ético de salvar vidas deixaria de existir: <<o acaso vai me proteger, enquanto eu andar distraído>>. A se confirmar tal comportamento dos gestores, assistiremos a uma providencial condenação orientada pela “informação” e pela “matemática”. Certamente, a história ficará concluída se, e quando, os cientistas descobrirem a vacina para imunizar nossa espécie.





 

Um trade-off “amoral”

Evidentemente, a busca de efetividade social exige que sejam providenciadas todas as condições para tratar adequadamente as pessoas infectadas, com perdas econômicas restritas a setores considerados não essenciais. Nada garante que todas as vidas serão salvas; ainda não há remédio eficaz para eliminar o vírus, nem vacina que evite contrair a doença. Além do mais, existem pessoas com comorbidades que favorecem à letalidade, seja com a atual versão do coronavírus ou de vírus já conhecidos ou ainda desconhecidos.

A princípio, não há incompatibilidade entre combinações que envolvam melhorar as condições para “salvar vidas” e “garantir o funcionamento de uma parte da economia”. Há escolhas intermediárias entre os extremos: (1) economia funcionando plenamente com um menor número de vidas salvas (elevada mortalidade); ou, (2) proporcionar condições materiais para salvar o maior número possível de vidas com um mínimo de economia. Esses extremos foram apresentados na Parte I desse texto. Um extremo, corresponde ao cenário: garantir o máximo de economia, sem as medidas para salvar vidas. O outro extremo, corresponde ao cenário: salvar o máximo de vidas, restringindo a movimentação das pessoas e o funcionamento da economia.

Aparentemente, as combinações de escolhas aquém dos extremos acima sugerem uma solução eficiente que poderia ser determinada a partir de um “programa de otimização”. Com as muitas informações (e pressões) oriundas dos mercados – diga-se – e com um modelo matemático, a solução ótima contemplaria garantias de funcionamento da economia e uma assistência médico-hospitalar que possibilitasse salvar certo número de vidas, um número a priori não determinável. O número de vidas a serem salvas é indeterminado porque não se conhece biologicamente o comportamento do novo coronavírus. Como a solução dependeria das informações referentes ao comportamento biológico do vírus, pode-se dizer que o número de vidas a serem salvas dependeria de uma “distribuição necrótica de probabilidade” associada ao processo de contaminação, considerando ainda as restrições orçamentárias que envolvem a sempre alegada escassez de recursos em geral.

O programa de otimização exigiria informações “precisas” sobre os “preços” de uma vida e aquele da economia, bem como a disponibilidade de recursos. Os recursos seriam alocados para a proporcionar serviços médico-hospitalares e, ao mesmo tempo, garantir determinado nível da atividade econômica. Teoricamente, a solução de mercado determinaria uma escolha ótima entre “vidas salvas” e “atividade econômica”, com base nos respectivos “preços”, na restrição orçamentária e nas preferências da sociedade ou dos segmentos sociais com maior poder de pressão.

De acordo com o pensamento neoclássico, o ponto de equilíbrio seria determinado quando a relação entre os “preços” fosse igual à taxa de substituição entre esses dois atributos da função preferência a ser otimizada. Como se fosse um trade-off do tipo “mais economia e menos vidas salvas”; ou “mais vidas salvas e menos economia”. A combinação “ótima” seria aquela em que a utilização de recursos proporcionasse alcançar determinado nível da “atividade econômica” e certo número de óbitos. Teoricamente, seria a combinação mais eficiente. Por ser uma decisão orientada pelo mercado, é impessoal. Em assim sendo, não importa o efeito-rebote em termos de contaminações decorrentes de contatos entre as pessoas em sua movimentação como livre consumidor.

Claramente, essa pseudocientificidade do pensamento ultraliberal é completamente absurda, reducionista, amoral e descolada de qualquer sentimento de empatia. É um argumento de mercado que pode muito bem servir de base teórica para justificar a decisão de flexibilizar o funcionamento da economia próximo ao ritmo de dantes. Todos e todas voltariam a fazer mais do mesmo, e da mesma maneira.

Mas, diante da impossibilidade evidente de o mercado fornecer o “preço” de uma vida, bem como o “preço” da economia, como estes “preços” seriam fixados? Quem teria autoridade moral para fixar esses “preços” e expressar as preferências entre “economia” e “vida”? A conclusão é que, no contexto da economia de mercado, a solução proposta pelo pensamento ultraliberal não seria possível. Como seria em uma economia de comando central? Nesta, a decisão será tomada pela autoridade central, pelo partido, pelo soberano ou pela família historicamente no poder.

Se uma parte da economia deixará de funcionar, o que deveria parar e qual o volume de recursos deveriam ser alocados para salvar vidas? Caso a autoridade valorize absolutamente mais a economia, a escolha levaria a um elevado número de óbitos; uma valorização absoluta da vida, os resultados seriam uma redução drástica redução da economia. Certamente, os tomadores de decisão fariam uma escolha de meio termo.

Seja uma economia de mercado ou de comando central, a decisão será mesmo do mandatário de plantão, eleito pelo voto da população ou não. Atenderá às pressões internas dos setores políticos e econômicos influentes e da geopolítica internacional; e, no final, decidirá sem a participação da sociedade civil. Eventualmente, seguirá algum protocolo e parâmetros da Organização Mundial da Saúde.








Navegar a ansiedade é preciso, viver não é preciso...


Uma das características da moderna sociedade produtora de mercadorias é a repressão e a acumulação de desejos e ansiedades. Pode-se até dizer que, em qualquer lugar do mundo, as necessidades básicas das pessoas são poucas e as mesmas. Mas, a vontade e os desejos individuais se ampliam e mudam frequentemente em função do avanço das inovações tecnológicas e da diversificação dos bens e serviços disponíveis no mercado. Não esquecer a função das mídias de massa que tomam um tempo significativo da vida das pessoas para lhes dizer que estão desatualizadas ou fora de moda. Desenha-se, assim, um contexto socioeconômico em que o “viver bem” está associado à realização do desejo por quase tudo, desejos artificiais, diga-se, despertados e estimulados nas pessoas pela publicidade massiva. Comprar ou ter a posse de um novo produto é a senha para alcançar a felicidade, o que significa sentir-se melhor do que os outros.

As inovações tecnológicas e de produtos desempenharam e continuam desempenhando um papel crucial na promoção do consumismo. Como a afluência material se tornou símbolo de poder e de status, a propriedade privada e a posse de bens são tidas como meios para alcançar ou aumentar a felicidade e o bem-estar individual. Muita gente se lança freneticamente na luta para ganhar mais dinheiro porque assim amplia seu conjunto de escolhas e possibilita o atendimento das necessidades para além daquelas consideradas básicas. E ainda, abre um caminho para o consumo conspícuo que lhe proporciona status social.

Assim, as sociedades modernas são gradativa e sistematicamente moldadas à imagem e semelhança do deus-capital. Embora o desejo de ter seja contido pelo poder de compra, as mídias mantêm acesa a ilusão de que a felicidade somente será alcançada com uma intensa participação na roda alienante do consumo da novidade, mesmo quando este é limitado.

Há uma crescente ansiedade e expectativa de que a atual pandemia seja rapidamente superada. Mas, tendo como pano de fundo, o contexto socioeconômico antes descrito, como será a vida no pós-pandemia? A flexibilização das atividades econômicas e sociais ensaiadas em algumas cidades brasileiras e de outros países, parece mostrar que as rotinas anteriores continuarão se repetindo. Assim mostram as cenas televisivas dos locais de compras que deixam visível o extravasamento de desejos recalcados durante o isolamento ou distanciamento social.

Mesmo assim, as cenas mostradas pelas emissoras de TV servem como um prenúncio de que a decisão para flexibilizar exige prudência das autoridades governamentais. É preciso estabelecer protocolos em que salvar vidas seja o objetivo maior, com garantias para que o sistema médico-hospitalar não entre em colapso.

Alguém poderia alegar que se a economia não voltar à normalidade mais vidas serão perdidas. O argumento é genérico e nunca explicita que parte da economia deveria ser garantida. É uma visão parcial, pois não considera as possibilidades de que deixar a economia funcionando sem restrições aumenta o risco de contaminações e de perdas de vidas. A economia será afetada posteriormente.

Será que no pós-pandemia – não se sabe a partir de quando –, continuaremos a fazer mais do mesmo e da mesma maneira? A experiência COVID-19 não terá sido suficiente para convencer a humanidade de que é preciso dar um basta nas mudanças climáticas e que o sistema econômico e social das sociedades modernas terá que ser substancialmente transformado? Será que o desejo de voltar a ser “normal” vai preponderar e aumentar os riscos futuros de que outros vírus mais letais sejam liberados da Natureza? E se não pudermos voltar à normalidade que muitos desejam?

Muitos também dizem que nada será como antes e que a humanidade irá repensar suas relações com os ecossistemas terrestres e aquáticos. Entre a repetição do mesmo e o potencial desse repensar há um conjunto de práticas que apontam para processos de transição centrados nas ricas dimensões da vida, em disputa com as lógicas da economia convencional. Essas práticas compõem uma crítica pedagógica radical que contribui para ampliar a compreensão de que a normalidade que muitos querem corresponde à reprodução de um modo de produção e de vida que ameaça a vida das espécies que habitam o Planeta. Uma economia antivida cuja força motriz é alimentada por fontes limitadas de energia fóssil. A normalidade, portanto, é o problema a ser superado. Outra normalidade é preciso.

A superação da normalidade prevalecente terá que ser abrangente, inclusiva e igualitária, fundada em uma liberdade substantiva orientada pelas leis que regem os ecossistemas. Assim, requer a ultrapassagem das ideias e dos projetos que são típicos da ideologia do pensamento econômico neoclássico (ultraliberalismo) que têm causado profundas desigualdades sociais, devastado o ambiente natural e acelerado a extinção de espécies. Os últimos quarenta anos testemunham os estragos causados à humanidade por esse modo de condução da economia. Ampliaram-se consideravelmente as dissociações que grassam a vida em sociedade.

As argumentações daqui por diante serão orientadas pela seguinte hipótese de trabalho: fazer o mesmo da mesma maneira que antes, leva a colapsos ambientais, ao caos social e econômico e à liberação de vírus mais letais. (Novas pandemias nos aguardam.) Por isso, é preciso outra normalidade, para que outro “fim” do mundo seja possível.



De ida para o passado


Ecologicamente falando, é razoável voltar à “normalidade” típica da civilização dita moderna? A resposta sensata é: não é razoável. Outra normalidade terá que ser inventada (ou reinventada) com base em relações harmoniosas entre Natureza, sociedade e economia. Essa orientação geral terá que ser assumida por todos os movimentos e lutas sociais para que se livrem, definitivamente, do reducionismo dos respectivos focos e constituam coletivos como fóruns mais amplos. Estes fóruns seriam estruturados para acolher intercâmbios de saberes e de experiências, envolvendo a construção cultural dos territórios; e servir como ágoras capazes de fermentar debates sobre o modo como os ecossistemas terão que ser tratados. É fundamental que os resultados alcançados sejam amplamente socializados, recorrendo-se a uma comunicação ecopedagógica, recorrendo-se aos instrumentos fornecidos pelas tecnologias disponíveis.

A outra normalidade, portanto, inverte o paradigma da economia centrado no crescimento ilimitado da produção. À medida que a economia cresce, incorpora uma proporção cada vez maior dos ecossistemas e lhes devolve matéria degradada e energia dissipada. Em termos entrópicos, a economia em crescimento, transforma uma quantidade crescente de matéria e energia de baixa entropia em resíduos de elevada entropia e perda de energia. O que estava disponível se torna indisponível. Em termos mais simples, o que era útil, agora é lixo. A experiência acumulada pela humanidade demonstra que a orientação para o crescimento tem sido deletéria para os ecossistemas, causa inúmeras desigualdades sociais e altera sensivelmente o clima.

Outra característica importante, da economia convencional é que ela produz apenas aquilo que será vendido e que proporcionará lucro. A outra normalidade terá que mudar sua finalidade de modo a produzir aquilo que for útil à sociedade, sem comprometer as condições de vida das demais espécies. A orientação é produzir o que for útil, com o mínimo de impactos negativos na Natureza.

Pode-se argumentar que, com qualquer outro modo de produção que não seja orientado pelo mercado e pelo lucro, a economia será menor do que é hoje em dia. (Menor e menos importante, acrescente-se.) Mas, se ela for a metade ou um quarto do tamanho atual, tanto melhor. A vida em sociedade será mais rica de sentidos pois as pessoas não estarão carregadas de frustrações e sofrimentos. Quem sabe, serão mais felizes.

Claramente, há um conflito entre as duas normalidades. Com a economia venerada pela ideologia ultraliberal, vários problemas se amplificaram, principalmente as desigualdades sociais e as agressões ao ambiente natural que tanto ameaçam a vida de todas as espécies. Como resolver esses problemas? Obviamente, não poderão ser resolvidos com o mesmo pensamento e as mesmas estruturas que foram responsáveis pelo seu aparecimento. Essa matriz de pensamento terá que ser profundamente alterada. Conforme Michael Huesemann e Joyce Huesemann (Techno-Fix – Why Technology Woon’t Save Us or the Environment), há a necessidade urgente de outra visão de mundo, de outro paradigma: outra economia, outra ciência, outra tecnologia, outra medicina...

Se o objetivo com a nova normalidade for estruturar uma sociedade justa e igualitária, em que a sustentabilidade ecológica seja parte fundamental de um paradigma que tem a vida como centralidade. A ideologia ultraliberal terá que ser rejeitada porque sua orientação para o crescimento ilimitado levará a um colapso ecológico global.

Em geral, as crises oferecem oportunidades de debates sobre contrapontos. Desde a Revolução Industrial, o fracasso do crescimento econômico ficou registrado pelas desigualdades que se foram desigualmente distribuindo no mundo: desigualdades entre países e dentro dos países. Nos últimos 50 anos, o fracasso do crescimento econômico ganhou amplitude e mais visibilidade, não apenas pelo aprofundamento das desigualdades sociais históricas, mas, sobretudo, pela aceleração da mudança climática que causou. Esses resultados abriram espaços para a discussão da tese do decrescimento.

Em sua origem (1972), a palavra decrescimento esteve associada à crítica de André Gorz dos malefícios causados ao ambiente natural pela expansão capitalista. Apresentava-se sob a forma de um conjunto de ideias e de valores para compor a crítica ao modo de produção e de vida da sociedade capitalista. São ideias que se contrapõem ao dogma do crescimento econômico ilimitado que podem contribuir para a construção dessa outra normalidade. Pode-se dizer que são ideias e valores que surgem em meio ao fracasso do crescimento econômico.

As ideias e valores inerentes ao conceito do decrescimento afirmam-se agora como princípios para aqueles que desejam sobreviver coletivamente com menos produção e um estilo de vida diferente. O tamanho certo da economia é identificado como um objetivo a ser alcançado com a desativação de setores e empresas que produzam supérfluos, artefatos que eliminam vidas e destroem o ambiente natural, ou aquelas mercadorias que apenas alimentam o consumo conspícuo de poucos.

A economia em decrescimento seguiria uma trajetória para um estado estável de equilíbrio dinâmico, ecologicamente sustentável, diverso e igualitário. As decisões sobre o que, como e para quem produzir seriam tomadas dentro de um quadro democrático em que a sustentabilidade ecológica e a equidade seja as dimensões fundamentais para a outra normalidade.

O arranjo social e político inerente ao decrescimento aponta, portanto, para uma agenda de discussões relacionadas ao “bem viver”: viver em sociedade e viver junto às demais espécies. Ao mesmo tempo, rejeita as “soluções” voltadas para acelerar o crescimento econômico a qualquer custo, que se restringe a produzir qualquer coisa, desde que movimente freneticamente o dinheiro. Com a outra normalidade devem prevalecer os princípios da precaução, da frugalidade, de formas de igualitarismo e de justiça ambiental. Nessa construção social, a economia teria a vida como centralidade e finalidade.

As ideias e os valores do decrescimento juntaram-se à Bioeconomia de Nicholas Georgescu-Roegen para propor uma nova utilização das energias humanas, de modo que sejam canalizadas para atividades criativas e socialmente produtivas. Sempre orientadas pela perspectiva de um mundo ecologicamente orientado e substantivamente democrático e igualitário. Seguramente, levam à conclusão de que o processo histórico da expansão econômica no mundo não possibilitou alcançar uma prosperidade genuína para todos os habitantes do Planeta. Por isso que a insustentabilidade ecológica das sociedades modernas expõe o dogma do crescimento econômico como uma insanidade.

Com o decrescimento a vida em sociedade ficará mais rica de sentidos. O dispêndio social de energia física e mental será dedicado à produção de bens e serviços que atendam às necessidades reais das pessoas, que são coisas que realmente precisamos. Nenhum esforço será dedicado à produção de supérfluos, que são coisas que realmente não precisamos. Com esse outro modo de produção e de vida, a humanidade terá incomensuráveis benefícios: redução de resíduos na produção e no pós-consumo; eliminação do descarte de supérfluos; o fim da contaminação do solo, cursos d’água e da atmosfera; corte substancial da emissão de GEE e estabilização geral do clima; recuperação das florestas e da biodiversidade; controle biológico dos vírus em seus habitats naturais... e assim por diante.

Chega-se à conclusão de que existe, de fato, uma contradição real entre salvar vidas e manter a economia convencional funcionando. A aparência da inexistência desse dilema é na verdade uma maneira velada de abandonar o isolamento social. Os empresários “sensibilizam” os tomadores de decisão fazendo chantagens com a ameaça do desemprego. Mas nunca manifestam qualquer preocupação com a vida de seus “dedicados” funcionários e a vida de seus familiares. Sabem que há uma reserva de corpos dispostos a irem ao altar dos sacrifícios em que se transformaram as empresas. E que precisam manter a roda do dinheiro girando e a economia se impondo sobre a vida de muitos (inclusive as suas).

O encontro da aparência com a essência, apenas ensaiado na Parte I desse texto, demonstrou que o sistema do capital não pode reproduzir-se apenas conduzido pela “mão invisível do mercado”. E que o COVID-19 desnudou a farsa de 40 anos de neoliberalismo no mundo: o crescimento do PIB mundial é a demonstração empírica de que o mercado e o dogma do crescimento não funcionaram e que não foram suficientes para proporcionar condições de vida dignas para as pessoas que habitam a Terra. Apena propiciou um acúmulo desmesurado de riqueza nas mãos de poucos: da minoria de beneficiários e de seus defensores. E degradou mais ainda o ambiente natural.

Quem professa o dogma do crescimento econômico exponencial ou é um louco ou um economista (Kenneth Boulding). Um louco por não tem equilíbrio mental para discernir que a economia não pode crescer ilimitadamente em um Planeta materialmente finito. Um economista porque sua formação resulta de uma ciência reducionista que congrega uma série de dogmas que atentam contra a vida de todas as espécies. Uma formação que induz esse profissional a desenvolver uma doença – a mania pelo crescimento econômico – que o leva a raciocinar como um louco. Quando o dogma do crescimento econômico for completamente desmascarado, os economistas que insistirem com esse dogma perderão sua utilidade e o ramo do “achismo” (“chutometria” econômica) deixará de existir.

Voltar à normalidade, ou seja, fazer a economia crescer e a vida perecer, ativará todos os sinais de alarme da Natureza. A vida em sociedade continuará carente de sentidos, pois o “viver livremente” restringe as pessoas à condição de vendedores e compradores de mercadorias. De maneira mais ou menos explícita, as pressões e as ações da classe dos proprietários (banqueiros, empresários, latifundiários e comerciantes) e de seus prepostos nas esferas governamentais, orientam-se pela “normalidade” de antes da pandemia. Governos, partidos políticos, parte importante da intelectualidade levantam as bandeiras da “normalidade”, do relaxamento do isolamento, para que a economia volte a funcionar gradualmente. Economistas e administradores de plantão opinam e estimulam de diferentes maneiras a volta da mesma normalidade que causou problemas sociais e ambientais agora ampliados com a pandemia.

Ressalvadas as exceções, antes da pandemia, a economia mundial já dava sinais de arrefecimento. A drástica redução da taxa de juros nos USA, na União Europeia e nos países periféricos mais fidelizados ao ideários ultraliberal como o Brasil, é justificada como uma tentativa de alavancar investimentos privados e retomar ou acelerar o crescimento econômico. Mas, além da “insensibilidade” a esse estímulo, a falta de resposta da atividade de investimentos tem sinalizado um desacordo com a “ciência econômica” estabelecida. Com o processo de crise em andamento, mesmo que a economia tenha se utilizado de alguns “respiradores” depois de 2008, o ambiente econômico não inspira o “otimismo” suficiente para a expansão da capacidade produtiva. Em acordo com Michael Kalecki, o risco se torna crescente com os investimentos em “bens de capital” que aumentam a capacidade produtiva.

No Brasil, a incerteza tem a ver com a demanda efetiva que tem os gastos públicos como um dos importantes componentes na equação macroeconômica da renda nacional. Em virtude das políticas ultraliberais para estabelecer o “estado mínimo”, a queda da demanda efetiva é o efeito rebote das privatizações, do desmantelamento do estado de bem-estar social, da redução de recursos para a pesquisa nas universidades públicas, do fim das políticas públicas voltadas para os segmentos mais vulneráveis da população, do desmonte da proteção ambiental, dentre outras medidas totalitárias.

O desmantelamento de tudo o que é público no Brasil colocou à venda as cidades e os centros históricos, ao tempo em que isolou em bairros periféricos moradores como reservas de força de trabalho para ocupar os empregos mais mal pagos do mercado de trabalho. Além do mais, e não menos importante, o ambiente político, decorrente da insanidade de um presidente sociopata em sua busca eterna de um inimigo, aumenta a incerteza e a insegurança que afastam potenciais investidores. Os “homens de negócios” exigem segurança institucional para investir ou aplicar seu sagrado dinheiro aqui nessas paragens amazônicas.

Além do desmantelamento da estrutura que fornece serviços públicos e proteção social à população trabalhadora brasileira – empregados(as), autônomos(as) e informais –, mais austeridade também significa mais e mais desmatamento da Amazônia. Aqui, o “estado mínimo” estimulou o investimento em agrotóxicos e outros insumos e tecnologias agrícolas; patrocinou a mudança de uso do solo; a expulsão de populações tradicionais para dar lugar a expansão da fronteira agrícola para o cerrado e para Amazônia e a livre exploração de minérios.

Podemos falar em uma normalidade sustentável? Ou mais enfaticamente, em uma normalidade ecologicamente sustentável?

Pelas argumentações até aqui apresentadas, a outra normalidade propõe o “bem viver” em oposição ao viver bem na base do cada um por si e à custa de outras pessoas. Propõe a “derrubada” do totalitarismo da economia convencional para colocar em seu lugar a ética da vida como centralidade. Acima de tudo e acima de todos, a defesa da Pacha Mama.

É preciso superar a nostalgia da liberdade aparente e fascinante da produção e do consumo sem limites. E perceber que a beleza não é um bem supérfluo. Desativar a matriz energética de base fóssil. Proibir progressivamente os recipientes de plástico. Estruturar uma rede de transportes urbanos coletivos, reduzindo o número de automóveis de passeio nas cidades. Eliminar o déficit de habitação. Fazer uma reforma agrária que possibilite produzir alimentos saudáveis. Instituir a autogestão das fábricas de bens socialmente úteis. Eis uma agenda de discussão voltada para a outra normalidade.









Como será o amanhã? Pergunte a quem souber...


A quem perguntar? Se nada será como antes, como será? O que será, será como cada um imagina?


No Brasil, para muitos empregados(as) formais, a experiência da redução da jornada de trabalho e do salário, ou da suspensão do contrato, mostra que o Estado pode garantir o emprego ou transferir determinada quantia durante um período emergencial. Para os informais, uma quantia para compensar parcialmente a redução de suas rendas em virtude do isolamento social. Em países situados no centro do sistema, comenta-se que a intervenção do Estado poderia ocorrer com políticas de renda mínima financiadas com a taxação de grandes fortunas. Seja onde for, são políticas na contramão das soluções de mercado. Mas, dada a situação de emergência, é possível um pouco de benevolência dos governantes e das elites: uma pequena concessão em nome da normalidade anterior, para que tudo permaneça como antes.

Mas, com algum grau de certeza, depois desse período de emergência as garantias deixarão de existir e o mercado de trabalho voltará a ser livre para funcionar de acordo com o humor da minoria que se apropria da riqueza gerada por muitos. É grande a desconfiança de que no pós-pandemia a normalidade de antes voltará para sua trajetória de mais incertezas e de mais inseguranças.

De fato, o COVID-19 mostrou para as pessoas mais atentas que a curva do crescimento econômico achatou em favor vida. Novos espaços foram abertos para inaugurar outras práticas de convivência entre as pessoas e para reacender um rico debate sobre transições voltadas para outro tipo de sociedade. Acabou mostrando que o tema da transição é um desafio grandioso e inadiável. Se nada for feito, as incertezas de antes se transformarão em certezas dramáticas no futuro. Um futuro ainda mais brutal, com mais colapsos ambientais, mudanças climáticas e com mais sofrimentos no enfrentamento de novas cepas dos vírus conhecidos e de novos outros que virão.

Com um pouco mais de atenção, o vírus também mostrou algo mais dramático. A constatação de que a Natureza pode descartar a espécie humana e prosseguir sua trajetória em direção a um estado de equilíbrio ecossistêmico para as espécies que permanecerem no Planeta. “Nossa casa comum está em chamas”, já alertou Greta Thunberg. Caso a espécie humana seja extinta, o Planeta apenas perde sua denominação: Aarde, Terra, Tierra, Terre, Earth, Land...

A conclusão é que nosso futuro comum depende, vitalmente, da “morte” do capitalismo e de todos os demais sistemas que adotaram e adotam seu modo de produção e de vida para exaurir o Planeta e provocar sofrimentos pandêmicos. Para além do capitalismo, acende a consciência de que a redução da incerteza e o aumento da segurança somente poderão ser pensados nas circunstâncias de outra normalidade. Uma que tenha por orientação dar um basta na mudança climática, evitar colapsos ecossistêmicos – quando ocorre a liberação de vírus – e promover justiça social. Caso contrário, a volta à normalidade anterior vai exacerbar os problemas hoje enfrentados pela humanidade.

O capitalismo é uma “contradição em processo” pleno de incertezas, de inseguranças e de desigualdades. A via ultraliberal amplifica esse processo mais ainda. A junção da crise econômica com o COVID-19 multiplicou os dramas da existência humana, ao tempo em que fez emergir o fracassou desse sistema em proporcionar condições de vida dignas para a humanidade. A globalização e o ultraliberalismo despencam diante da constatação de que sem o Estado não há como proteger a população em momentos de crise, seja socorrendo financeiramente (os “coitados”) empresários e banqueiros ou criando estruturas por onde transbordem migalhas para os demais segmentos (os “abastados”) da população.

A atual situação de pandemia, contudo, ainda transmite a sensação de que o mundo desmorona e aponta para um futuro com incertezas avassaladoras. Terrível é imaginar que no pós-pandemia continuarão as ameaças de deterioração do ambiente natural, que serão aceleradas mais ainda com as promessas insanas de retomada do crescimento econômico ilimitado. Mais contaminação da água e do ar; mais devastação de florestas; mais consumo de energia fóssil; mais vírus... Os discursos e as ações apontam para a manutenção da matriz causal das catástrofes ambientais e das desigualdades vivenciadas.

O que destacar nas crises que vivenciamos? Primeiro, os sistemas públicos de saúde; na economia, os setores que produzem bens essenciais para enfrentar uma situação de emergência. Por outro lado, a constatação de que há uma enorme produção de supérfluos que precisa ser paralisada, e de que há métodos de produção que afetam a saúde humana e desequilibram os ecossistemas. Em segundo lugar, a identificação de possibilidades concretas de reduzir a pobreza em todos os países. O Estado pode minorar as desigualdades sociais com uma política de renda básica universal, independentemente do nível de desemprego atingido.

>>>Uma vez superada a pandemia muita coisa terá que ser repensada. Uma sociedade mais justa, mais ecológica, mais feminina, mais democrática, menos desigual... Algo precisa ser repetidamente dito: as coisas não poderão continuar como antes. Que uma parte significativa da humanidade não pode continuar vivendo em condições subumanas e que o mundo não pertence a 1%.

As crise têm o potencial de fazer as pessoas reavaliarem suas rotas causais de problemas vivenciados de modo a evitá-las no futuro. A atual pandemia mostra que as rotas têm a ver com as ações antropogênicas que levaram e levam a colapsos ambientais, à perda de biodiversidade e à destruição de habitats. A lei ecológica da interconectividade da vida terá que ser definitivamente incorporada ao cotidiano social, quaisquer que sejam as circunstâncias.

Evidentemente, seria ingenuidade esperar que o amanhã traga mudanças espontâneas, menos ainda mudanças radicais na direção apontada pela argumentação aqui apresentada. Uma pandemia não será suficiente para provocar mudanças tão fundamentais. (Segundo Ailton Krenak, “A única mudança radical possível é se desaparecesse a espécie humana do planeta.”)

Embora a Terra seja um sistema materialmente fechado – porque não realiza trocas com outros corpos celestes – o mesmo não acontece com as atividades antrópicas que nela ocorrem. Além de serem diferentes sistemas abertos, essas atividades têm levado a perda de biodiversidade e destruição de habitats, colapsos que estão na raiz das pandemias. Com o crescimento econômico ilimitado também cresce a possibilidade de que ocorram pandemias simultâneas. Se a circulação simultânea de vírus terá força suficiente ou não para reduzir drasticamente, ou mesmo extinguir essa espécie tão incômoda, é uma questão ainda em aberto. Se for uma redução drástica, a população remanescente será obrigada a rever radicalmente sua relação com a Natureza.

Mas, antes que ocorram pandemias simultâneas, ainda vale, como sempre, recorrer às lutas e aos movimentos sociais que tenham perspectivas para além de suas pontualidades. Para viver, navegar é mais do que preciso. Contudo, munidos de mapas, de cartas e cartografias que contenham informações e registros do modo como as populações tradicionais – indígenas, povos das florestas, quilombolas – se relacionam com a Natureza. Ao lado, os princípios da Agroecologia, da Economia Ecológica, da Economia solidária e as ideias de pensadores e pensadoras do bem-viver e do decrescimento. É preciso navegar e viver sem esgotar o Planeta e sem produzir discriminações e iniquidades.


Aécio Alves de Oliveira

aecioeeco@ufc.br


Recente divulgamos aqui outro artigo do autor, intitulado "O coronavírus e a economia no Brasil: quais opções?" 






01 maio, 2020

NÃO VAI PASSAR


Também publicado dia 02/05/2020 no Portal O Povo Online/Blog do Eliomar


Não se engane: o mundo não vai voltar “ao normal”. A pandemia Covid-19 está alterando de forma definitiva as relações econômicas, sociais e políticas. Os anos 20 serão um marco divisório.

Esqueça o “quando tudo isso terminar, voltaremos à nossa vida”. Para os que sobreviverem, essa vida de antes, que sob o capitalismo se constituía em uma subvida, não existirá mais. Mudanças profundas, embora em sua maioria sutis, estão ocorrendo. Óbvio que a exploração e a opressão continuarão, talvez até mais brutais.

Antes mesmo da pandemia, o sistema já parecia ter alcançado sua fronteira histórica: “Se procurarmos pela verdadeira e real produção de mais-valia e a respectiva necessidade de aumentá-la, é forçoso concluir que o coração do capital mundial já parou de bater... Mas seja como for a desvalorização do dinheiro em seus detalhes, cujos preâmbulos já se deixam entrever em grande parte do mundo como ciclo inflacionário, ela constitui o final da história do modo de produção baseado no dinheiro” (Robert Kurz).

Como jornalista sinto falta de uma reflexão mais profunda por parte dos comunicadores e de uma busca mais ampla para entender as causas e principalmente as consequências do que estamos vivendo.

Nas coberturas, o factual se sobrepõe de maneira desproporcional à análise e à investigação. Isso é ainda mais acentuado no Brasil, onde a usina de crises e absurdos movida por Bolsonaro e seus seguidores de extrema direita parece gerar a cada hora uma nova aberração. Para não falar no crescimento da desordem da informação (desinformação, mal-informação e informação incorreta). Já vivíamos uma epidemia de mentiras, alavancada pelo neofascismo via redes sociais. Com a Covid19, piorou.

O fato é: aqueles(as) que se acham donos do mundo e que definem e são definidos(as) pelos rumos da sociedade produtora de mercadorias, estão bastante empenhados em usar a Covid-19 a seu favor e em tirar proveito dela para um redesenho de um mundo ainda mais distópico do que a atual. Destaco que também existe a possibilidade, ainda que remota, de romper com esse modelo de vida e de produção que nos conduz ao genocídio e ao suicídio enquanto espécie, sem falar na destruição da natureza e do planeta. Seguem alguns dos conceitos fundamentais para entender esse Dreadful New World: biolegitimidade, cadeias de suprimento, capitalismo informacional, cripto moeda, desobediência civil, emergência climática, fascismo/neofascismo, guerra híbrida, ID2020, massa sobrante, nanotecnologia/nano chip, neoliberalismo, OMS, panóptico, quarta revolução industrial, renda mínima universal, servidão voluntária, serviços ecossistêmicos, tecnopolítica, vigilância em massa…

Por enquanto seguimos como definiu o filósofo belga, Raoul Vaneigem: “Lá fora, o caixão, aqui dentro, a televisão, a janela aberta sobre um mundo fechado!”

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